Uma fada madrinha em Barcelona

28 de Outubro de 2012,


Local: Aeroporto de Barcelona, num sofá do McDonald.
Hora: 04h42 (hora espanhola)

A fada madrinha do filme Cinderella da Disney
Já conheço os cantos à casa do aeroporto de Barcelona, pelo menos os cantos entre as portas A e B e, claro, a zona dos restaurantes. Há um mês atrás cheguei a este aeroporto por volta da meia noite. E como uma autêntica Cinderela angustiada com a perda do sapato de cristal, eu tinha uma nota de dez euros na mão e uma máquina de águas e snacks que não aceitava notas. 'E agora? Como bebo eu água?' Esta angústia juntou-se à de ter de dormir num aeroporto e sentir-me um pouco sem abrigo. Ponderava eu a opção de ir à casa de banho abastecer-me de água, quando a fada madrinha apareceu. 

Uma senhora da limpeza, rechonchuda e com um ar amigável passou por mim e olhou-me como se soubesse que eu queria perguntar-lhe algo. No meu 'portunhol' lá perguntei onde podia trocar a nota ou comer alguma coisa e fiquei a saber do Café di Fiori que está aberto 24 horas por dia. Mais tarde descobri a zona dos restaurantes e o McDonald que, também, funciona o dia inteiro. A resposta, o sorriso e o ar maternal que a senhora tinha descansaram-me a consciência nessa noite, 'Existem seres humanos amáveis fora do meu Portugal. Vai tudo correr bem', foi o que pensei.

Hoje, um mês depois, diferente e a mesma ao mesmo tempo, tentei dormir com a minha tão adorada manta vermelha da TAP, mas o frio das portas de embarque B - pois agora já é quase Novembro - não me deixaram senão dormitar. Descobri que as casas de banho, por alguma razão, são muito mais quentes. Deixei-me dormir por uns segundos sentada na sanita da casa de banho. Quando de repente acordei decidi que por mais quente que fosse, não era confortável e o cheiro não era nada agradável. Assim, resolvi andar por entre as portas de embarque e, talvez, visitar o McDonald que não dorme. Assim o fiz.

Depois de me acomodar num sofá bem fofinho da maior cadeia de fast food do Mundo e de começar a escrever estas linhas, a minha fada madrinha apareceu, mais uma vez. Desta vez não tinha desejo nenhum para lhe pedir, mas reconheci-a. A mesma senhora, o mesmo uniforme, o mesmo sorriso, o mesmo turno, o mesmo mp3 e os mesmos auriculares que a entretêm enquanto limpa com uma esfregona as escadas sujas da entrada do restaurante. Sorri ao vê-la, imaginei a sua família. 'Três filhos meigos e um marido que descansa em casa e, se calhar, se levanta precisamente a esta hora por a achar a menos na cama. A fada madrinha faz o seu trabalho contente, provavelmente voltará a ter um turno destes daqui a quinze dias, como sempre. Hoje enquanto trabalha ouve músicas que lhe lembram os seus meninos e, por entre elas, aparece a canção que a fez apaixonar-se outra vez pelo marido.' Guarda a esfregona uma última vez, e avança com o seu carro. Olha para cima e tem um sorriso na cara, olha para mim e, sem qualquer expressão de reconhecimento, avança. A verdade é que só a Cinderela se lembra da fada madrinha. Porque não um conto sobre a equilibrada fada madrinha? A sábia fada que até sabe feitiços e direções, talvez o conto fosse mais interessante.